Poucas crenças enraizadas são tão limitantes no mundo do trabalho quanto “a fragilidade dos vulneráveis”. Até bem pouco tempo, talvez 15 ou 20 anos atrás, a vulnerabilidade era um tabu reservado aos consultórios de psicanálise e às conversas privadas entre os RHs mais evoluídos.
Nos corredores das empresas, circulando entre baias e e-mails, ou pautando as conversas da Rádio Peão, a fama do profissional vulnerável variava entre “frouxo”, “pouco ambicioso” e “amedrontado”, entre outras crueldades.
Nos dicionários de Língua Portuguesa, o vulnerável ainda é tratado de forma desumana: “ferido; sujeito a ser atacado; derrotado; frágil; prejudicado ou ofendido”.
“É preciso coragem para ser imperfeito e aceitar e abraçar as nossas fraquezas e amá-las. E deixar de lado a imagem da pessoa que devia ser, para aceitar a pessoa que realmente sou”, escreve a professora e pesquisadora da Universidade de Houston, Brené Brown, que passou as duas últimas décadas estudando a coragem, a vulnerabilidade, a vergonha e a empatia.
Tanto conhecimento fez dela autoridade no assunto e best-seller mundial com os livros A coragem de ser imperfeito e Mais forte do que nunca, livros que alcançaram o primeiro lugar na lista do The New York Times. Sua palestra, “O poder da vulnerabilidade”, é um dos TED Talks mais assistidos da série, com 37 milhões de views.
“Vulnerabilidade não é fraqueza, é poder. Me arrisco a dizer que é um superpoder. Precisa-se de muita coragem para reconhecer-se limitado e vulnerável. Reconhecer-se é assumir a responsabilidade pelo próprio caminho e não culpar o mundo por seu sofrimento”, reforça o professor Fabiano Gomes, mestre em Gestão de Negócios pelas universidades Unisinos, do Brasil, e de Poitiers, na França.
“Sejamos nós o CEO da empresa ou profissionais da base, todos somos vulneráveis”, assegura Gomes, que também dirige, em Porto Alegre, a Fabiano Gomes School, Meditação e Desenvolvimento Pessoal. “A grandeza está em reconhecer, não em negar. A tomada de consciência é o primeiro passo para a evolução. Se eu nego, me torno escravo do que neguei.”
Autoconhecimento
Para compreender como a vulnerabilidade afeta o desempenho, também perguntei a Daniel Lustig, personal growth e CEO da consultoria Mind Factory, responsável por treinar executivos e atletas de alta performance, qual a chave para enfrentar momentos de incerteza.
“Autoconhecimento. Toda e qualquer pessoa está sujeita a estar mais ou menos vulnerável em certas situações da vida. É importante se conhecer a fundo para entender as nossas reais qualidades e falhas ou falta de habilidades. Reconhecer os nossos pontos fracos é entender que somos vulneráveis, mas que podemos evoluir.”
Embora veja conexão na atuação de executivos de alta performance e atletas (“na busca contínua por estudo e desenvolvimento de habilidades para aumento de performance, no mindset vencedor e nas cobranças”), Lustig reforça que não existe uma fórmula mágica para liberar o potencial máximo de um profissional, afinal, cada indivíduo reage de forma diferente a um determinado estímulo.
“Porém, aqueles que realmente conhecem seus atributos e qualidades, falhas, valores e sistema de pensamento, têm um aumento significativo de rendimento. Porque seus níveis de autoestima e segurança se ampliaram. Porque abrem espaço para outras formas de leitura das situações. O real trabalho na alta performance está no detalhe, em entender onde estamos gastando mais energia com o que é menos relevante e transferir para aonde terá mais objetividade.”
Gomes e Lustig concordam que o ser humano busca a integralidade, ou seja, não deixa seus valores em casa para ir trabalhar. Logo, essência e propósito devem estar presentes na vida como um todo. E é aí que a vulnerabilidade exerce seu verdadeiro poder: quando está lastreada na verdade.
As profissões, portanto, devem (ou deveriam) ser a mais pura manifestação de quem somos.
“O trabalho é o mais poderoso instrumento de realização do propósito. Já há movimentos muito fortes de construção de empresas e ambientes que valorizam isso. Mas há muito a fazer. Precisamos de consciência, treinamento e cultura. Ter coragem para se vulnerabilizar requer força”, conclui o professor Fabiano Gomes.